A III Guerra Mundial
“...e os alemães e os seus canhões.”
da canção João e Maria, de
Chico Buarque
O acaso levou-me a um livro de Georges Valois, Le Cheval
de Troie – Réflexions sur la philosophie et sur La Conduite de la Guerre, escrito
em 10 de Dezembro de 1917, no 4º ano da I Guerra Mundial, e editado pela Nouvelle Libraire Nationale (2ª ed. de 1918)
em Paris.
Georges Valois (1878 - 1945) foi um pensador e politico
francês que previu uma nova forma de organização económica e social na base dos
valores nacionalistas e do reformismo social, o que o levou ao longo da sua
vida a tomar posições radicais de direita e de esquerda.
Foi capturado a 18 de Maio de 1944, no hotel d'Ardières, pela Gestapo e morreu de tifo,
em Fevereiro de 1945, no campo de concentração nazi de Bergen – Belsen. Neste
campo também morreram, no mesmo ano, Anne Frank e a sua irmã.
O livro Le Cheval de Troie é um panegirico contra a Alemanha. Além disso, no capítulo sobre
a conduta da guerra, propõe uma reforma completa do exército e prevê a vitória
das forças aliadas pela utilização dos tanques, a que ele chama o Cavalo de
Troia.
Valois ao escrever este livro não antevia, embora escreva que
a União da Alemanha seria sempre um perigo para a Europa, uma II Guerra Mundial
ainda mais mortífera que a primeira.
O que me leva a partilhar convosco a leitura deste livro não
é com certeza a condução da guerra (La Conduite de la Guerre) com a entrada dos
tanques, o Cavalo de Troia.
Valois sempre defendeu a utilização desta arma, mas foi o
exército inglês que a usou, atravessando em segredo a linha Hindenburg com 150
a 200 tanques de guerra, no dia 20 de Novembro de 1917.
Este dia marcou uma viragem no destino da guerra, até lá a
frente alemã tinha sido inviolável.
O resto da história todos a conhecem: a vitória dos aliados e
a assinatura do tratado de Versalhes, com todas as consequências para a
Alemanha
Há várias curiosidades neste livro e uma delas é ter sido
publicado com várias páginas censuradas, estava-se em plena guerra…( ver acima)
Na introdução, o autor faz várias reflexões filosóficas,
entre elas conta que em 1914 a França oficial (la France officielle) acreditava
que o homem prosseguia o seu caminho na via do progresso e estava sobre o ponto
de conquistar o poder de comandar a guerra e expulsá-la do planeta.
A Grande Guerra, segundo Valois, não é contra a Alemanha mas
sim contra a Deutsche Kultur. Insurge-se contra aqueles que pensam que a
guerra é entre a democracia e a autocracia e que o problema ficaria resolvido
com o aparecimento da democracia na Alemanha.
Escreve: “ Qu'elle soit
autocratique, aristocratique ou démocratique, l'Allemagne unie demeurera le
lieu du monde où les philosophes ont identifié les destinées de la civilisation
et les destinées d'une nation”, citando aqui a análise de Emile
Boutroux (prefácio da obra de Santayana, L'Erreur de la Philosophie allemande,1917): “ Le monde doit, dans toutes ses parties, être
artificiellement organisé et qu'il appartient à l'Allemagne, et à la elle
seule, d'effectuer cette organisation”.
Apoiado nestas ideias, o autor é frontalmente contra a
assinatura de uma “paix blanche”,
quer dizer sem a destruição do exército, do império alemão e da dominação da Deutsche
Kultur.
A Alemanha, nesta data, avançava com a proposta de paz sem
anexações nem indeminizações. George Valois teme essa ideia e diz: ” Une
impulsion unique, venue de Berlin, organisant l'Europe, puis la planète,
conformément au plan allemand, à l'humeur allemande, à la science allemande, à
la mystique allemande, soumettant les hommes aux conducteurs allemands,
disloquerait l'humanité en moins d'un demi-siecle, et provoquerait
l'ecroulement de la civilisation. Tout serait à recommencer.”
Palavras proféticas, 20 e tal anos mais tarde surgem Hitler,
o nacional-socialismo e as teses da superioridade ariana. O que não imaginava o
autor é que a sua vida acabaria num campo de concentração nazi.
Outra crítica do autor à intelligentzia francesa é que
esta não acreditava, em 1914, na possibilidade de uma guerra entre a França e a
Alemanha, nem sequer entre as nações civilizadas. “ La guerre, pensait-il,
c'est le fait des nations barbares; nous autres civilisés, nous avons la lutte,
la lutte économique”, “ Se peut-il que, dans notre siècle de haute
civilisation, la guerre soit possible?”
Sim, foi possível, e foram muitas durante o século XX. Será
que só agora, na entrada do século XXI, a guerra ou a luta passa a ser apenas
económica, como diziam os dirigentes franceses em 1914?
Será que o fascínio do povo alemão pelo Deutsch Kultur,
a constituição da Mittel-Europa e o Império Alemão já não existe?
A Alemanha atual quer seguramente uma Europa forte, com uma
moeda forte que confronte o império americano e o asiático. Para isso abriu as
fronteiras a leste e irá fazer de novo o pacto germano-soviético, digo russo, considerando
os povos do sul seus inferiores.
Como dizia Georges Valois: - a organização do mundo será
feita à semelhança da Alemanha e cabe a ela, e só a ela, efetuá-la.
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