IRLANDA
Fui
a Cork , segunda cidade mais populosa da república da Irlanda, no dia 26 de
Abril de 2018, acompanhar a Teresa que ia falar na universidade local,
importante centro educacional, para apresentar a experiência portuguesa no
acolhimento aos refugiados.
Certamente
porque esta é uma boa experiência.
Decorria
então a campanha para a votação da despenalização do aborto e pudemos assistir a várias manifestações prós e
contra.
A
velha Irlanda católica, com uma igreja considerada das mais retrógradas do
mundo que ainda há pouco tempo viveu um confronto sangrento com os seus
compatriotas protestantes do Norte, iria votar SIM pela despenalização do
aborto, numa escrutínio popular muito concorrido, com 66,4% dos votos
expressos.
Assim,
a ilha fica dividida, a parte sul, república da Irlanda, de maioria católica,
votou pela interrupção voluntária da gravidez, ao passo que a parte norte,
pertencente à Grã Bretanha, apesar desta ter promulgado a lei da despenalização do aborto, exclui dessa
possibilidade
.
.
Sobre
o lema Her Body Her Choice os
irlandeses entraram na via do progresso, não sem terem passado, como em muitos
países, pelas mortes de algumas grávidas que chocaram a sociedade, nomeadamente
a de uma jovem indiana.
Por
isso, há quem proponha que a nova lei se passe a chamar " Lei
Savita": nome de uma jovem de 31 anos que imigrou para a República da
Irlanda para continuar a sua carreira de dentista. No verão de 2012, tudo
parecia sorrir para esta jovem, estava grávida. Mas, ao 4ºmês de gestação, um
aborto espontâneo interrompe abruptamente todas as suas esperanças.
Apesar
da confirmação segura do insucesso da gravidez e da não viabilidade do feto, os
médicos recusaram-se a proceder à evacuação uterina que teria podido impedir a
sua morte por septicémia.
Foi
a morte desta jovem que relançou, neste país, os debates sobre a lei que
proibia absolutamente o aborto.
Efetivamente,
a sociedade conservadora irlandesa tinha, em 1983, por referendo, introduzido a
proibição da Intervenção Voluntária da Gravidez (IVG) na sua constituição. A morte
de Savita lembrou a perigosidade e a inadaptação da legislação irlandesa.
Lá
como cá uma nova geração de militantes surgiu combatendo as velhas causas
defendidas por uma sociedade retrógrada. Foram os mesmos jovens que combateram
a favor da adopção por casais homossexuais, a mesma que contribuiu à chegada ao
poder do jovem primeiro ministro progressista Leo Varadkar. Desde o inicio do seu mandato, Varadkar,
apostou numa evolução da sociedade irlandesa, ele que nunca escondeu a sua
homossexualidade, mas mostrava-se reservado sobre a questão do aborto porque
temia que ela levasse a uma cissão no seio da sociedade da república.
Mas
quando em 25 de Maio a Irlanda vota a favor da revogação da oitava emenda
constitucional que impedia qualquer lei liberalizante do aborto, Leo Varadkar
disse : " Nós não somos um país
dividido" 1,4milhões de pessoas votaram pela supressão da emenda (ao
passo que 840.000 tinham contribuído para a sua adoção há 35 anos) não houve
diferença entre as cidades e o campo nem entre mulheres e homens, estes últimos
votaram maioritariamente "sim".
Leo
Varadkar num discurso arrebatado citou a poetisa norte americana Maya Angelou
na sua obra célebre Phenomenal Woman
: " Os sofrimentos sofridos durante
decénios pelas mulheres irlandesas não podem ser apagados, mas hoje, nós
assegurámos que eles não poderão
repetir-se"
O
governo está determinado a andar depressa e publicar uma lei, até ao fim do
ano, que permitirá a IVG até às 12 semanas sem condições e até às 24 semanas em
caso de perigo grave para a mãe ou para a criança.
Assim
a ilha fica dividida se uma parte importante da população está favorável a uma
mudança da lei, uma parte da classe política é contra (ao contrário da Irlanda
do Sul)
Um
responsável da Amnistia Internacional afirmou num comunicado publicado a seguir
à votação no Sul: " Nós não podemos
ser considerados como cidadãos de segunda e ser deixados num canto do Reino
Unido e da Ilha".
A
bola está do lado de Teresa May, mas a sua maioria instável depende do apoio de
seis deputados conservadores irlandeses do Democratic
Unionist Party, e … politique oblige.
Esperemos
que esta vitória eleitoral na República da Irlanda dê um novo alento aos
militantes pró aborto do Norte.
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