DEMOCRACIA
Critica à democracia
representativa
Creio ser o momento oportuno para
discutir a democracia.
Apesar das questões financeiras estarem na ordem do dia, os
nossos sucessivos governos representativos apresentam uma tal desordem e
corrupção que é urgente sairmos deste estado.
Desde sempre, a luta empreendida pelos povos têm tentado
melhorar e reforçar a DEMOCRACIA.
Infelizmente, este nome foi utilizado em muitas situações que
o desvirtuou da sua essência, por exemplo no tempo do fascismo falou-se de
democracia orgânica para mascarar uma Ditadura.
Sir Henri Summer Maine, em 1887, entendeu por democracia
unicamente uma forma particular de governo. Disse: “há duas maneiras de
conceber o governo de uma sociedade, e de aí duas diferentes maneiras de
apreciar as relações entre governantes e governados: ou o governante é superior
ao vassalo, é seu chefe, tutor e guia e qualquer que sejam as suas faltas os
governados devem-lhe todo o respeito e em caso algum poderão retirar-lhe a sua
autoridade; ou os governantes são simples agentes e mandatários dos governados
e neste caso a censura é um direito, a origem da autoridade reside nos
governados que dão ou a retiram como julgam mais útil”.
Penso que todos estamos de acordo com a segunda hipótese, o
problema coloca-se em sabermos de que forma e quando retiramos a autoridade aos
governantes? E quase todos os países reconhecem hoje a soberania popular como
forma de democracia.
Rousseau, ao escrever o seu livro Contrato Social, há perto de 300 anos, parece dirigir-se aos
cidadãos do seculo XXI quando afirma que não poderá haver soberania e liberdade
politica sem a intervenção consciente e ativa dos cidadãos.
Já Jaime Magalhães de Lima escrevia, em 1888, talvez com
influencias roussianas,: «o mandatário eleito pelos seus concidadãos por
maioria de votos, sobre uma questão de princípios, não representa nem a
minoria, nem todas as nuances da maioria; nada garante que ele compreendeu e
não atraiçoará a vontade dos seus eleitores». É tão atual!
Rousseau evoca a Democracia na sua própria essência, ou seja
o poder exercido na totalidade pelo conjunto do povo. A questão essencial para
ele era conservar a soberania do povo, como diz a canção emblemática do 25 de
Abril, “o povo é quem mais ordena”.
Nesse sentido, não existem hoje muitos governos democráticos,
como era o caso da maioria das tribos que discutiam antes de decidir. Entre os
países desenvolvidos, o único caso que conheço é a Suíça - não será por acaso
que Rousseau era Genebrino. Na Suíça os eleitos podem ser sempre submetidos à
possibilidade de um referendo imposto por um grupo de cidadãos. Nalgumas
cidades, nos Alpes, ainda se usa a famosa Landsgemeinde,
que consiste em reunir a população na praça principal e votar de braço no ar,
como no tempo de Guilherme Tell.
Na vida política dos povos não existe problema mais
importante do que o da Democracia e para o assinalar as Nações Unidas
determinaram atualmente o 15 de setembro como o dia da Democracia.
Entendo a Democracia como um sistema político que postula a
igualdade de direitos dos cidadãos e a liberdade de intervirem nos assuntos do
Estado.
Infelizmente, no nosso país foi propagandeado até à exaustão
pelos partidos do arco do poder que só existe uma forma de democracia, a
Democracia representativa e que o povo só pode manifestar-se de quatro em
quatro anos.
Vejamos o que dizia Rousseau, a este respeito: «o povo inglês
pensa que é livre, mas engana-se redondamente; ele só o é durante as eleições
dos membros do parlamento: logo que eles são eleitos, ele torna-se escravo, ele
não vale nada», e acrescenta: «nestes curtos momentos de liberdade, o uso que
dela faz merece bem que a perca».
Em pleno seculo XXI, é impensável voltar às decisões à volta
de uma árvore, mas isso não nos impede de pugnar por uma Democracia
Representativa, Participativa e Deliberativa. Por que não se trata apenas de
participar em discussões e resoluções que a maioria das vezes os governantes
não ligam, dado que se julgam os melhores. Temos de ter o poder de deliberação,
no sentido do adjetivo deliberative
dos ingleses cujo significado é discutir e decidir.
A fórmula da Democracia representativa chegou ao fim e
afastou dos atos eleitorais a maioria dos cidadãos, criando um divórcio entre
governantes e governados.
Este governo, cada dia que passa, fere de morte a essência da
Democracia, com uma atitude autista e arrogante dos seus dirigentes. Passos
Coelho disse: votaram em mim para eu pensar pela minha cabeça, que se lixem as
eleições, etc..., num desprezo total pela democracia. A corrupção e o compadrio
alastraram e são o maior perigo para a Democracia representativa, que passa
desde a compra dos votos até à oferta de empregos milionários pelos
capitalistas aos nossos representantes nos órgãos do governo.
A Constituição da República Portuguesa prevê o Referendo, mas
desde o 25 de Abril só foi utilizado duas vezes - na lei da interrupção
voluntária da gravidez e na proposta de regionalização. É certo que a lei só prevê
que o referendo seja vinculativo com mais de 50% de eleitores, mas mesmo assim
deveríamos pressionar a AR e o governo a realizá-lo em momentos decisivos para
a política do nosso país, como foram a entrada na CEE e no Euro.
Todos sabemos que as instituições europeias boicotaram este
método com medo das vontades dos povos. Neste sentido próprio do termo
Democracia, Portugal não o é, porque é corrente ouvir da boca dos governantes
que não querem organizar um referendo com medo que o povo responda não, quando
eles querem que responda sim.
É certo que algumas vezes o povo suíço vota à direita e com
cariz chauvinista, como no recente caso da proibição da construção das
mesquitas, porque alteravam o estilo arquitetónico das cidades helvéticas, mas
estas são as regras do sistema e não deixa de ser a vontade do povo.
A utilização do referendo é uma das minhas propostas para que
a Democracia seja mais participativa e deliberativa.
Claro, que se deve promover uma educação para a Democracia,
começando nas escolas, e o exemplo de acabar com a disciplina de formação
cívica é bem revelador do desprezo dos atuais governantes pela Democracia.
Estes governantes, que de liberais não têm nada, deveriam ler
o que disse Stuart Mill, nas considerações sobre o Governo Representativo: «a
função de deliberar é uma em que uma grande pluralidade de pessoas pode cumprir
melhor do que um único individuo. (...) Ouvir e debater com outras pessoas,
frequentemente de opinião oposta, auxilia os cidadãos e os seus representantes
a crescerem e estabelecerem uma ligação adequada entre talking and doing, no discutir e o fazer».
Várias formas de democracia deliberativa têm sido
experimentadas em vários países, sobretudo formas de governação local. Na
Alemanha a Plamungszelle, os Júris
dos Cidadãos nos Estados Unidos e Grã-Bretanha, os Town Meetings e as Consensus
Conferences em Chicago. O orçamento participativo que se iniciou no fim do
seculo passado em Porto Alegre, com muito sucesso, tem- se espalhado pelas
cidades europeias.
Em Portugal, cidades como Lisboa, Portimão e Oeiras adaptaram
este exemplo, mas diria de uma forma tímida e com pouca divulgação. Alguém sabe
como funciona, em Lisboa, o orçamento que poderá ser votado pelos cidadãos de
17 de Setembro a 31 de Outubro? A fim de estimular a participação nestes
orçamentos, os medias têm uma importância fundamental, senão arriscamos a
percentagens participativas baixas. Pessoalmente, preferia o método já
utilizado em outras cidades europeias do sorteio de cidadãos, a exemplo dos
jurados americanos e de governos da Antiguidade e da Renascença Italiana, na
constituição de um conselho consultivo orçamental, o que permitiria uma maior
mobilização dos cidadãos.
Sem comentários:
Enviar um comentário