quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Mercado e Indústria Alimentar








Mercado e Indústria Alimentar

O coração tem razões que a própria razão desconhece
Blaise Pascal
Uma das características do mercado livre é o recurso ao marketing apoiado numa propaganda antiética em que para a venda de um produto vale tudo.
Durante toda a minha, já longa, carreira de médico tenho assistido às guerras na indústria farmacêutica a maioria das vezes não dignificantes para os respectivos laboratórios.
Mas, agora, esta minha reflexão é sobre a guerra comercial que se instalou na indústria alimentar, na maioria senão na totalidade dos casos de uma forma muito pouco ética.
Todos se aperceberam do ataque feroz dos produtores de soja* aos produtores de lacticínios, levando estes a seguirem o velho ditado popular: "Se não os podes vencer, junta-te a eles". Assim, nos escaparates dos supermercados já vemos "leites de soja" com a marca comercial dos verdadeiros leites.
Esta confusão instalada de leites vegetais e leites animais também pertence a uma manobra de marketing muito pouco ética, induzindo no consumidor que se trata verdadeiramente de um leite. Se ao invés rotulassem de sumos vegetais baixaria seguramente a sua venda.
Como já escrevi: "até prova em contrário só as fêmeas dos mamíferos dão leite".
Nos anos pós Segunda Guerra Mundial e aproveitando a promoção, sempre o marketing, de uma imagem da mulher com uma silhueta esbelta, magra e de seios pequenos, a indústria farmacêutica/alimentar propagandeou, influenciando o meio médico, os leites industriais que iriam substituir o leite materno, sem qualquer prejuízo para o bebé.
Para quê incomodar as mulheres - mães, se o leite produzido em laboratório era superior ao materno? Vamos manter as nossas mulheres esbeltas e poupá-las ao "trabalho" de amamentar os seus filhos.
Ainda vivi esta situação, com muitas mulheres a pedirem ou "exigirem" para secar o leite após o parto. Porém, a investigação laboratorial provando que nenhum laboratório conseguia produzir algo semelhante ao colostro e a observação clínica de muitos pediatras preocupados com a ausência de relação mãe/criança, essencial para o desenvolvimento psíquico da criança, começou a reverter o problema.
Até que nos anos sessenta realizou-se um congresso mundial de pediatria em que se chegou à conclusão que a melhor alimentação para a criança era o leite materno, facto que hoje ninguém contesta.
Também nos anos sessenta em muitos países em vias de desenvolvimento, entre eles Cuba, preocupados com o crescimento das suas crianças que saíam de uma situação de fome e má alimentação realizaram-se campanhas nas escolas de distribuição de leite.
Infelizmente em Portugal optou-se, muito mais tarde, pela distribuição de garrafas de leite achocolatado muito mais calórico que o leite simples.
Parafraseando Pascal direi que os mercados tem razões que a própria razão desconhece.
Hoje a guerra está instalada contra os produtores e os industriais de lacticínios. Os grandes produtores de soja tinham de escoar os seus produtos dos enormes latifúndios e por isso quando vamos aos supermercados encontramos "leites" de soja, coco, amendoim, arroz e cada um publicita as suas vantagens. O controlo dos suplementos alimentares na Europa não tem uma directiva comum, ficando a autorização e vigilância à responsabilidade de cada Estado membro, o que julgo ser negativo.
Claro que o lucro é o objectivo dos industriais e produtores destes produtos e infelizmente arranjam sempre argumentos pseudo científicos para convencerem os incautos.
Debrucemo-nos, agora, sobre a composição nutricional do leite de vaca.
Vejamos a composição e o valor nutritivo médio de 100 ml de leite meio-gordo pasteurizado, o mais utilizado pelas nossas famílias:
1.       Água: 90 ml, contribui para a hidratação do nosso organismo
2.       Cálcio: 117mg
3.       Glúcidos: 4,8 g
4.       Proteínas: 3,3g
5.       Lípidos: 1,5g,  o teor em matérias gordas varia com a desnatação: o leite gordo contêm 3,6g e apenas traços no leite magro.
As calorias são 46 Kcal, a contribuição energética do leite é pequena em face da sua riqueza em nutrientes.
O valor incontornável do leite é sem dúvida o Cálcio. Uma única caneca de leite é suficiente para 1/3 das necessidades diárias. Os outros compostos do leite (fósforo, proteínas e lactose) participam na assimilação do cálcio. O leite contém também: iodo, potássio, zinco e vitaminas B2 B12 e A. 
Devido ao seu alto teor de Cálcio há pelo menos três fases da vida humana em que se torna obrigatório consumir lacticínios (leite, iogurte, queijos): durante o crescimento, na gravidez e na terceira idade.
Para aqueles que afirmam serem intolerantes à lactose devem fazer o teste e em caso positivo já existem no mercado leites sem lactose.
   * O poderoso negócio mundial da soja e dos seus derivados envolve muitos biliões de dólares, sendo os Estados Unidos o maior produtor mundial.