S. JERÓNIMO … MARTINS
(o
benfeitor)
O
dono da pastelaria, onde costumo tomar o meu café da manhã, juntamente com
Manuel Villaverde Cabral, Lobo Xavier e mais 2 colunistas do jornal I, acharam
uma ótima ideia a ação do Pingo Doce no
1º de Maio, sem nada de criticável, mesmo até louvável. Pois não deram a
possibilidade a muitos portugueses fustigados pela crise de puderem encher as
suas dispensas com produtos alimentares?
Comparar
esta ação com os saldos em Paris, francamente Manuel Villaverde Cabral (não
confundir com o meu afilhado o historiador com o mesmo nome) ….
Assisti,
em Junho de 1967, na Suíça, a um açambarcamento, quando da guerra
israelo-árabe, em que foi lançado o pânico, nas populações helvéticas, do
perigo de um confronto generalizado e em que eram distribuídos papéis com
informações dos mantimentos que se deveriam levar para os abrigos antiaéreos.
A
guerra só durou 6 dias, mas os supermercados ficaram vazios durante vários
dias, até ser reposto o stock. Também isto em nada pode ser comparado com a
ação do merceeiro Manel dos Santos, aliás aqui não houve rotura de stocks no
dia 2 de Maio todos os super funcionavam normalmente.
Será
que estes doutos comentadores, sociólogos, economistas, jornalistas,
politólogos que propagandeiam a ação do S. Jerónimo querem também ter um cartaz
pendurado, como tem a Zita Seabra e o António Barreto, nas lojas do Pingo Doce
a anunciarem os vinhos? Continuem que vão certamente ser presenteados.
Na
altura dos meus avós, a mercearia do bairro vendia fiado a muitas famílias da
classe média que viveram as crises dos anos trinta e da guerra. Também nessa
altura as pensões dos militares, como no caso das minhas avós maternas, foram
cortadas por Salazar o que logicamente fez baixar o poder de compra. Muitas
destas famílias endividaram-se e alguns merceeiros deste país enriqueceram.
O
que se passou no dia 1º de Maio, com a jogada do Pingo Doce foi grave. Não há
dúvida que se tratou de uma provocação aos trabalhadores deste país já que as
grandes superfícies tinham sido estigmatizadas por estarem abertas no feriado
obrigando os seus empregados a trabalharem. E de certeza que trabalharam muito
mais que nos outros dias.
O
merceeiro quis mostrar como o povão, como dizem os brasileiros, se rendem a um
prato de lentilhas e passam horas nas filas para obter um desconto de 50% nas
compras superiores a cem euros.
E
resultou, ficaram com a dispensa cheia mas sem dinheiro para pagar
eletricidade, a renda da casa , etc...
Uma
senhora afirmou que esteve seis horas na fila da caixa para pagar, porque
muitas pessoas pagavam com cheques ou cartões e o dinheiro dos magros salários
ainda não tinham entrado no banco. Por isso L. Xavier, não foi por ser o
primeiro dia do mês, que foi montada esta ação.
O
consumismo é próprio do capitalismo, não é da democracia e os trabalhadores não
trabalham só para consumir, como disse Villaverde Cabral. Eu sei que hoje se
tenta colar as duas coisas:-democracia/capitalismo, mas não é verdade.
Deixo
aos economistas fazerem as contas desta jogada que deve ter sido fabulosa, acho
que o benemérito arrecadou 90 milhões de euros! Boa! E vai tudo para a Holanda.
Pessoalmente
chocou-me a multidão de gente que teve de estar mais de dez horas à espera para
ter um desconto de 50% com produtos que muitos deles devem estar a chegar ao
fim da validade. Nesta gente há muito “chicoespertismo” e muita falta de
cidadania, mas também e sobretudo muita necessidade. Foi a classe média baixa,
que já não é classe média, que correu desenfreadamente aos supermercados Pingo
Doce na miragem de uma boda aos pobres que não foi.
Veio
me também à memória, a última aula do Prof. Fanconi, pediatra de grande renome
internacional, em Lausanne, nos idos anos de 1971.
Em
vez de dissertar sobre um assunto clássico e livresco da pediatria, contou a
sua ida a um congresso internacional em Bogotá. Como é hábito, nestes momentos
de convívio, o Prof. de Pediatria Colombiano ofereceu aos seus convidados, um
soberbo churrasco numa enorme herdade, sua propriedade. Em determinado momento,
o Professor suíço teve de ir à casa de banho e teve um enorme choque, que pelos
visto nunca esqueceu: - Os restos estavam a ser despejados nas traseiras da
casa aos pobres camponeses, como se de cães se tratasse.
Há
talvez nesta comparação de imagens muito esquerdismo da minha parte, mas foi
isso que senti quando o merceeiro “ofereceu “ alimentos abaixo do preço de
mercado.
Mas
não será o que se passou na Colômbia, certamente com trajes europeus, o mesmo
que este governo quer: o assistencialismo?
Também
na Colômbia, havia certamente intelectuais que argumentariam: “é melhor que os
camponeses comam restos do que passem fome”.
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