sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

A GUERRA COLONIAL

Hoje seria o aniversário do meu irmão Abílio,  faria 73 anos.
A vida separou-nos no inicio da idade adulta, quando o carácter de um Homem se forma. No longínquo ano de 1969, estava eu exilado em  Lausana e ele na Guerra Colonial em Luanda e o Carlos, meu irmão mais novo, entre Lisboa e  Londres. Todos em cidades começadas por L.

O reencontro familiar em 1974 foi fantástico e trabalhámos juntos, no mesmo hospital, no mesmo serviço e no mesmo consultório.

Mais tarde escreveu um romance Henda Xala, onde transparece a cada pagina o seu amor por Angola. No inicio do livro, depois dos prefácios, escreveu: - " Não sabia que se podia amar uma terra, fisicamente, como quem ama uma mulher. "
Mas, apesar disso nunca me contou o que se tinha passado em África.

Só agora, muito mais tarde, leio as cartas que escrevia aos meus pais e garanto-vos que são verdadeiras peças literárias.
Tenho hesitado em publicá-las neste blogue, porque não sei se ele aprovaria. Contudo, em sua homenagem, vou transcrever parte de uma carta escrita por um Oficial da Acção Psicológica na Guerra do Ultramar, enviada aos meus pais, e que ele intitulou : - Mataram a inocente Isabel-
A carta fala sobre a Grande Operação " NOVA LUZ", que visou a destruição de quartéis terroristas no RIO DANGE. Cito: -" É por aqui  que na manhã de 14 de Fevereiro de 1969, 6ª feira, se desloca uma escolta da "ONÇA", estacionada nas proximidades do antigo quartel de BRNO, que por força do destino e por liberdade de escolha do caminho, seguiu a marginal do rio Dange e passa pelo Cunha à Irmão, para acompanhar o Alferes médico, Dr. Abílio Mendes que se deslocava a Luanda, via Aerotáxi Margarido.
O Sol iluminava as extensas lavras já referidas, que se estendiam até à linha de horizonte visual, e desesperadas, apanham mandioca que havia de matar a fome aos filhos entregues ao destino da Mãe Preta, refugiados para lá do DANGE.

De repente um grito de alarme, e começa o tiroteio que pretende impedir a fuga.
Por instinto natural o pequeno rebanho foge, e a Mãe, Ana Arsénio, de menino ao colo agacha-se junto a uma árvore para defender o seu filhinho da chuva das balas. Adivinhou providencialmente o que a tropa queria, e foi recolhida com carinho e alegria pelos nossos homens afectivos e sentimentais, embora com abandono de outros filhos que ficaram irremediavelmente perdidos, por falta de protecção, como ela diz em choro convulsivo.
Mas caiu por terra o velho Fortuna, com um tiro certeiro que lhe cortou cerce o osso da perna! Outros teriam sido feridos, mas a tragédia e o drama desenha-se com as lágrimas do velho Fortuna que viu sair mortalmente a jovem e graciosa Isabel, de 15 anos, sua filha, que expirou os últimos suspiros nos braços do bondoso e culto Alf. médico Dr. Abílio Mendes, que procurou ainda salvá-la em vão!"....." perguntava baixinho de modo a comover até às lágrimas, num último suspiro: - Vou morrer? ....." assinado Falcão
A foto pode não corresponder a esta acção.





4 comentários:

  1. Fiquei por aqui e ... não resisto a comentar uma vez mais.
    Foi enriquecedor ter-vos conhecido profissionalmente e por estes postes saber mais um pouquinho sobre vossa vida.
    Contactei mais com o Dr Abílio-pai, na EDP e depois no consultório,a quem estamos gratos.

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  2. Conheci o Dr. Abílio Mendes, em meados de 1969,no Dange, estava ele na companhia de cavalaria "Os Centauros", já em fim de comissão, assistia a nossa companhia, a CCaç 2505.
    Era uma excelente pessoa, humanista e solidário, gostava de conviver. grande médico,nunca puxava dos galões, um GRANDE HOMEM.

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